Linha de transmissão de energia
Cacildo Marques - S. Paulo
O
prejuízo é grande demais.
Se a ideia é
estender o "horário de pico" por mais uma hora, o que se tem
conseguido é transformar a curva suave do pico em platô, da mesma altura que a que
seria a do pico. Em vez de alguns minutos ou segundos com sobrecarga máxima,
tem-se uma hora ou mais com essa mesma sobrecarga. O sistema de distribuição
pode explodir, se o governo insistir nessa estratégia.
De onde
vem a base para essas afirmações? De várias frentes.
Copiado e
adaptado do Horário de Inverno de alguns países do hemisfério norte, quando o
horário de verão voltou, assim que se encerrou o regime militar, as lâmpadas
usadas na iluminação das residências, das empresas e dos logradouros públicos
eram de filamento, em sua maioria, um objeto que dissipava calor de um modo
grosseiro, escandaloso até.
Meu amigo
José Zatz, um grande físico, declarou naqueles tempos que a adoção do horário
de verão trazia uma economia de pelo menos 4%, um grande ganho. Uma hora
excedente de claridade do sol, sem necessidade de acender as ampolas quentes,
era o fator principal dessa economia.
No século
XXI as lâmpadas de filamento desapareceram quase que por completo do mercado e
pouquíssimas residências ainda as utilizam. São as lâmpadas dicrólicas e as de
led que ganharam as ruas.
Os
aparelhos que mais demandam volume de energia elétrica hoje são outros, a
começar pelo ar condicionado, que não era usado em ambientes residenciais no século
passado. Prover uma hora excedente em cada dia significa presentear a população
com mais uma hora diária de disponibilidade de energia para uso em ar
condicionado, em refrigeradores, em ventiladores, em recarga de celulares e
tábletes, em TVs e em outras situações várias. De fato, mais uma hora de gasto
exagerado de energia a cada dia.
Como se
pode constatar isso? Com os números. Eles estão disponíveis não apenas para
enfeite, mas para servir de fonte primária de dados que permitam gerar informação
consistente e esclarecedora.
Quem olha
uma tabela de números referentes a consumo de energia, como as da ANEEL, não vê
nada de especial. Quem pega esses números e os processa, estabelecendo relações
entre eles, passa a ver fatos assustadores.
Como
desconfiei que os números não estão sendo tratados de forma sensata? Ora, por
causa das informações que os técnicos estão retirando deles e divulgando.
Aquela
economia agregada que José Zatz garantia existir no século passado, agora os
técnicos dizem que ocorre "no horário de pico". Ora, com que base dizem
isso? Comparando com quê? Significa essa informação que as regiões com adoção
do horário de verão apresentam demanda 4% abaixo daquela apresentada pelas
regiões sem horário de verão? Não parece. Pelo contrário, os números
disponíveis, sobre consumo mensal ou anual, apontam para a situação contrária.
Como é
possível que as regiões com horário de verão gastem menos no horário de pico se
na hora de fechar a conta no fim do mês o aumento de consumo tem sido muito
maior nessas regiões que nas de horário normal?
Alguém
ainda pode argumentar que é possível, sim, mas a coisa toda soa estapafúrdia.
E eu
argumento que haveria, sim, uma economia brutal de energia nas regiões de maior
demanda se, em vez de dar mais uma hora de luz solar em cada dia, o governo
mantivesse o horário das regiões do sul e encetasse uma campanha vigorosa para
que a população poupasse energia. Desligar os refrigeradores durante uma hora
no suposto horário de pico em dias alternados; desligar por uma hora também os
aparelhos de ar condicionado em alternância com o desligamento dos refrigeradores,
também por uma hora; tomar banho com o chuveiro desligado em dias de muito
calor. Estas são algumas das propostas que podem ser feitas.
Alternar os dias de desligamento dos refrigeradores
é importante porque se toda a população desligar ao mesmo tempo, nos mesmos
dias, a redução de gasto será tão grande nesse horário que pode ocasionar um
colapso em todo o sistema assim que as máquinas forem religadas.
Para
confirmar minha suspeita, copiei alguns números da ANEEL.Comparando os meses de
dezembro com setembro de 2013, um com horário de verão sobre outro sem o tal
horário, vi que a relação de consumo, por região, eram as seguintes, em milhões
de MWh (que arredondei para três ordens após a vírgula): 2,366/2,354 (CO);
5,001/4,797 (NE); 1,815/1,734 (NO); 1,375/1,325 (SE); 5,520/5,189 (SU), Essas
relações significam aumentos percentuais respectivos de: 0,50; 4,25; 4,68;
3,79; 6,40. Nesse ano de 2013 vemos que a região com maior aumento de consumo
foi o Sul, com 6,40%.
Para
2014, fiz a comparação de novembro com setembro, porque os números de dezembro
ainda não estavam disponíveis. O resultado é aterrador: 2,632/2,555 (CO);
5,308/45,113 (NE); 1,341/1,901 (NO); 14,409/13,324 (SE); 5,770/5,318 (SU),
Essas relações significam aumentos percentuais respectivos de: 3,00; 3,82; -29,46;
8,15; 8,48. No ano de 2014 a região com maior aumento de consumo foi o Sul, com
8,48%, mas o Sudeste ficou bem próximo.
Fica
visível, com a redução de consumo na região Norte, que Estados sem horário de
verão não são vilões no gasto de energia. O grande aumento ocorre nas regiões
com esse horário.
Separei
os dados em NE+NO, regiões sem o horário, e CO+SE+SU, bloco das regiões com
horário de verão. Fiz a média ponderada com a população dessas regiões e pude
constatar que o aumento no primeiro caso foi de -3,57%, enquanto que nas
regiões ao sul chegou ao índice de 7,66%.
Vemos aí
que, com essa política de horário de verão, o sistema de distribuição de
energia elétrica ainda não explodiu por puro milagre!
Cacildo
Marques - FEV*2015
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