Organização Cultural de Defesa da Cidadania - Entidade Apartidária

sábado, 3 de abril de 2010

Detratores

Detratores

*

Quem diz que eu roubo alguma coisa

Nunca passou de vil bandido.

Quem diz que eu bebo destilado

Bebe os esgotos do nazismo.

E nos nazistas tropeçamos

Sempre que andamos sem aviso,

Pois são dezoito em cada cem

Dos que atravessam nossa trilha.

*

Quem diz que eu minto anda abraçado

À sombra dos mais tolos mitos,

Anda fugindo da verdade

Como o boçal foge dos livros.

E o mentiroso é uma serpente

Que abrindo a boca sempre esguicha

O fel que torna amarga a noite

E apaga a luz do próprio dia.

*

Quem diz que nutro alguma inveja

Vive na inveja contorcido,

A triturar os próprios ossos,

No vale azedo da agonia.

Pois o invejoso enxerga o outro

Como o maior que sempre o humilha,

E então inverte o que antevê:

Escuridão, se algo cintila.

*
Cacildo Marques




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2 comentários:

  1. Um poema só se torna um clássico quando não tem endereço conhecido. O poéma do Cacildo já nasce clássico. Pergunta ele: Quem diz que eu roubo; quem diz que eu bebo e quem diz que eu minto...
    Cacildo só discordo quanto ao que eu minto, pois o poeta é um fingidor/ Que finge tão completamente que chega a fingir que é dor, a dor que ele deveras sente. Fernando Pessoa disse isso e eu concordo.

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  2. Bem lembrado, Chico. Mas podemos continuar fingindo (acho que ele quis dizer que um poeta é como um ator, mutatis mutandi). O fingidor não é um mentiroso. Além do mais, na quadra, ele confessa que finge para dentro. E aí descobre que de fato sente a dor que pensa estar a fingir. É aquela história: você mergulha na ideia achando que está representando e descobre que está se expondo.
    Cacildo

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