Organização Cultural de Defesa da Cidadania - Entidade Apartidária

sábado, 18 de dezembro de 2010

O CAMINHO DA INDIGNAÇÃO


O caminho da indignação

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. . . Este documento foi redigido quando os eventos de junho de 2005, envolvendo altos personagens, ainda não tinham vindo a público. Aos poucos este ato de indignação transformou-se num estranho grito, até agora abafado, onde se misturam raiva e tristeza, pelo Brasil e pelos brasileiros, profunda mágoa de ver a transformação desta pérola da América do Sul em paraíso da bandidagem e de quem vive aqui para burlar, sem cessar, milhões de pessoas entregues ao desespero de suas situações individuais na beira do colapso.

. . . Quantas dessas pessoas não estão imbuídas de um sentimento de derrota perante a vida quando na verdade elas são vítimas inocentes de um egoísmo que ultrapassou todos os limites da decência humana?

. . . A raiz do mal é visível todos os dias: uma corrupção pérfida, incessante! Sem que a sociedade reaja de uma maneira direta, sem violência: processar o Estado ou as autoridades competentes por não cumprir o juramento constitucional de assumir, cada um, o seu cargo para o bem do povo!

. . . Ora, sabemos que tal processo é impossível! Sabemos que ninguém irá ressarcir as vítimas de depressão nervosa causada pelo desespero do desemprego permanente ou dos empregos temporários mal pagos, mas indispensáveis para quem não tem alternativas de renda.

. . . Não sei distinguir se este grito é de dor aguda e profunda ou se é simplesmente a revolta da alma diante de um silêncio perturbador ao não ver a sociedade civil, como um todo, assumir esta indignação sem aguardar o grito de ninguém. Um grito coletivo sim, pois o custo disso é visível e sentimos, todos nós, na pele.

. . . Sinto que a sociedade civil está cansada de aceitar tudo em silêncio; ela assiste a tudo ao seu redor, vê as pessoas mais queridas chorar, entregues ao desespero, e ela fica sem saber o que fazer diante de tanta tristeza; o que fazer para que a esperança volte a ser algo espontâneo, natural do ser humano. Perder dinheiro, perder a saúde, perder entes queridos, muitas perdas acabam sendo superadas. Mas perder a esperança em dias melhores? Voltar a sonhar exige uma resposta conjunta da sociedade. Não se trata mais de menor abandonado, nem de idoso sem assistência adequada, nem de escolas deficitárias em ensino, nem saúde deixada por conta de Deus: é toda a sociedade que paga, cada um a sua maneira, as consequências de políticas desastrosas ao aceitar que o ser humano seja tratado como precioso eleitor um dia, voltando a ser, passadas as eleições, um mero "problema social". Que vexame! Posso dizer, sem dúvida nenhuma, que o Brasil em que aportei em 1965 não é mais o mesmo! Ele foi destruído, desprovido de seu espírito que encantava quem quer que chegasse de países onde reinam conflitos graves. É verdade que o Brasil cresceu, evoluiu, mas por que não permitiram ao elemento humano ter um nível de progresso compatível com tantas riquezas que surgiram desde então?

. . . A razão dolorida começa a delirar e exige que o redator pare e volte ao texto original, explicativo de uma indignação muito mais extensa expressa no Manifesto complementar. Antes peço desculpas por certos delírios, afirmando que não há intenção de ferir ninguém, mas chamar a sociedade como um todo a ver os rumos desta nação que foi tirada de seu caminho porque simplesmente arrancaram os trilhos do trem. Este vai a toda velocidade ao encontro de seu destino. Cuidado!

. . . Eis os motivos pessoais primeiro.

. . . As vésperas de 2007, antes, portanto, de fechar o ano que transcorreu, surgiu uma necessidade intima de manifestar o meu repúdio por uma série de fatos que assolam o cotidiano brasileiro. Esses sentimentos de revolta interna vinham acontecendo há algum tempo já. Foi preciso primeiro aguardar o que sairia das urnas: triste realidade! Se muitos deputados não foram reconduzidos ao seu cargo privilegiado, outros, com sérias suspeitas de envolvimentos duvidosos, conseguiram transpor as barreiras e voltar ao cenário de Brasília. Mesmo assim, fica um estranho sabor na boca ao constatar que a renovação dos mandatos não tomou em conta os vícios da função. E estes continuam como sempre foram: nenhuma responsabilidade com o eleitor.

. . . A indignação que eu quis expressar revelou-se como uma destas fontes que não conseguimos mais fechar uma vez liberada a força que retinha a água na profundidade de nosso ser.

. . . De indignação em indignação, de análises em análises dos fatos vivenciados, acabou saindo um extenso relato que intitulei "Manifesto de uma indignação na véspera de 2007". Esse foi avançando e o grito de indignação precisou ser contido, pois eu julgava que não havia, nessa época, quem o escutasse e desse alguma importância. Eram só glórias para um Presidente que se achava superior a todos os anteriores sem deixar que a própria história dê essa interpretação. É que veio o tempo que esvazia todos os assuntos importantes: o período contido entre as festas de fim de ano até o carnaval. Com uma série de esvaziamentos: os urbanos, o político-econômico, o das questões que tomaram conta da nação ao longo do ano anterior e o da longa espera até meados de março quando se supõe que Brasília recomece a pensar as questões nacionais mais imediatas. Se não resolverem primeiro garantir questões internas partido-eleitoreiras!

. . . Enquanto isso, uma estranha serenidade reina no palácio dos congressistas e no país das maravilhas que destoa com a pressa de solucionar problemas cruciais do povo em geral.

. . . A indignação, sob suas mais diversas formas, está aí para tentar lembrar que nem todo silêncio é consentimento, nem toda passividade é aceitação dos fatos como irreversíveis.

. . . Sentimo-nos fracos, isolados, sem que essa fraqueza e isolamento esvaziem o nosso consciente; fortalecidos por nossa vontade de deixar rastros, mesmo ínfimos, do não aceite de um sistema absurdo que deixa florescer expressões de pátria amada ao mesmo tempo em que se omitem as consequências de atos que emanam de seus vícios, de aceitar que uma volúpia voraz coloque o Brasil, pátria enorme e generosa, no nível de paises desgraçadamente pobres!

. . . Enquanto uns clamam por uma pátria igualitária e justa, outros continuam insistindo no erro de achar que o estado de seus bolsos é mais importante que a felicidade pátria!

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Precedentes

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. . . (Este documento foi revisto e enviado para divulgação pública diante dos fatos graves oriundos do próprio Congresso, quando ao fechar o Ano 2010 o Congresso votou por aumentar de maneira unilateral os seus salários e dos escalões mais importantes da nação, com índices nunca aplicados aos subalternos (mais de 61%), isto é, ao povo em geral, em todas as camadas do povo, desde os lixeiros e catadores de rua até engenheiros e advogados, passando por enfermeiras, médicos e todo tipo de mão de obra indispensável para garantir a função minimamente decente de trabalhar para o bem da nação como um todo; pois não haveria nenhuma riqueza que pudesse zombar ou ignorar a importância de todas as profissões que garantem o funcionamento desta nação.)

. . . Quando avançam os argumentos que as responsabilidades assumidas exigem salários de acordo, garantindo também que é um meio de lutar contra apropriações indiretas de somas vultosas, só sobra o simples contra-argumento de que ninguém obriga ninguém a ser candidato: a renúncia está aí para qualquer um que se sentir mal pago. Seria mais honesto ir oferecer os seus serviços em empresas que valorizam seus talentos!

. . . Esta "introdução" ao consequente manifesto de mesmo nome se tornou necessária diante do volume insuportável que a indignação passou a dominar este personagem testemunho da história de um Brasil onde o destino da enorme maioria está nas mãos de uma ínfima minoria.

. . . O tempo do silêncio acabou. A vida pode ser arrancada da gente como tantas outras estão sendo ceifadas por mãos misteriosas. Mas silenciar leva a uma morte pior ainda quando ela invade a nossa alma deixando-nos nos sentir impotentes e testemunhas caladas de cenas absurdas num país que tem tudo para ser uma das nações mais felizes desta esfera terrestre que gira misteriosamente dia e noite e que inspirou um lindo slogan partidário "O sol nasce para todos".

. . . Infelizmente, ao considerar justos reajustes salariais com tamanhas proporções, os deputados parecem afirmar que existem mais de duas categorias de cidadãos: o de primeira classe, como eles, e os escalões de cima e de segunda, terceira e mais classes até chegar ao salário mínimo que acaba sendo uma clara demonstração da péssima distribuição de rendas no Brasil.

. . . Será possível não entender esta indignação que se alastrou até a presente data, 17 de dezembro 2010, e que não perderá suas razões de ser nos próximos anos. A menos que a sociedade civil intime seus eleitos a mudar de postura e assumir novas responsabilidades para acabar com este cenário de um Brasil extremamente rico no Congresso e um Brasil extremamente complicado, socialmente, nas pontas.

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São Paulo, 17.12.2010

Toufic Attar

Pela cidadania reconhecida, participativa e exercida livremente.

Um comentário:

  1. Caro Toufic, caros leitores,

    Há uma petição relacionada ao estopim deste texto, caso desejem participar...

    http://www.peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=P2010N4596

    Considero um engano confiar que essas petições por si só tenham qualquer efeito na política real, mas elas servem de apoio - ainda que às vezes apenas moral - ao trabalho dos que de fato fazem a diferença.

    Abraços,

    ale

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