Organização Cultural de Defesa da Cidadania - Entidade Apartidária

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Voto Aberto Romântico





' É importante mantermos o instituto do voto aberto no Parlamento, mas não quando se trata de escolher ou condenar pessoas. Os que defendem voto aberto nessas circunstâncias acreditam, como todos os românticos, que o mundo está pronto (já que por natureza 'o homem é um animal político') e que as perseguições, tiranias e ditaduras não têm chance de voltar.


' Seguem algumas razões pelas quais o voto aberto sobre pessoas revela-se frívolo.


' A) Guilhotina. Na Revolução Francesa os assassinos mapeavam os pescoços para mandar à guilhotina através do histórico de voto aberto na Assembleia Nacional (Condorcet foi condenado - entre outros - por ter votado contra a execução de Luís XVI).


' B) Ditadura. Desde então, em situação de ditadura presente, voto aberto significa voto de todos na proposta do governo (como ocorre na China atual), pois ninguém é louco de se posicionar contra a avalanche.


' C) Tirania. Supondo que um tirano admita manter o Parlamento, ele só aceitará voto secreto se for um tiranete imbecil. O tirano propriamente dito exigirá voto aberto, para ter o controle das posições dos representantes. Se a tirania admite voto, tem de ser voto aberto.


' D) Teleguiados. O 'povo', como patrão dos servidores públicos, pode agir como alguém que vê nos representantes seus delegados ou seus teleguiados. No primeiro caso, o povo é democrático. No segundo, é tirano. Um povo tirano é algo muito mais tenebroso que um governante tirano.


' E) Liberticidas. A ideia de voto aberto, controlável à distância, é liberticida. Era assim que funcionavam os pseudodelegados do regime soviético nos tempos do 'centralismo democrático'. Os debates e os avanços nas discussões eram puro exercício de retórica, sem nenhuma consequência, porque o voto era determinado previamente pelos líderes.


' F) Violentados. No voto aberto, o parlamentar violenta sua consciência para agradar o povo tirano, ou o governante tirano. Na votação do 'impeachment' em 1992, só os que tinham tara de controlar os atos alheios divertiam-se em ver o parlamentar sem convicção própria votar contra o Presidente para satisfazer a vontade dos caras-pintadas. Logo depois, uma mentira levou à cassação do Deputado que comandou a votação que resultou nesse 'impeachment', que sob voto secreto muito provavelmente não teria acontecido. Era um bom Presidente? Não. Deveria ter sido cassado? Não. Ele foi eleito não pelos caras-pintadas, mas pela maioria dos eleitores.


' G) Conhecimento. Se os regimes democráticos têm Parlamento não é porque alguém tem de votar em propostas, simplesmente. É porque alguém tem de estudar e debater os temas políticos candentes e tem de se dedicar com mais empenho que o cidadão da sociedade civil às questões em tramitação. Se for para o parlamentar votar com o mesmo conhecimento de causa do eleitor comum, não há necessidade do Parlamento, porque o eleitor pode votar diretamente, como no regime Pinochet. Se o Parlamento existe é para que um grupo de representantes tenha domínio mais profundo dos temas a serem votados. Assim, o parlamentar é delegado, não teleguiado, e não faz sentido que seu voto seja sempre rastreado pelo eleitor, que não tem tempo nem dados para tomar a melhor posição nas votações complicadas. Se elegemos um representante como delegado e deixamos de ter confiança nele, na próxima eleição nós o trocamos. O risco de o delegado votar contra quem lhe delegou poder é o preço do regime representativo. Se o eleitor deixa de confiar no seu representante, não é agindo de forma tirana que o problema será resolvido. O que é necessário é fortalecer o Parlamento, não fazer dele um teatro de canastrões medrosos e pusilânimes, anulados em suas vontades políticas.




Cacildo Marques



Nenhum comentário:

Postar um comentário